Kierra (detalhe) - Michael Shapcott

A menina, com roupas simples e com um pássaro preso entre os dedos, ficava encostada ali nas esquinas da cidade movimentada, tentando chamar atenção. E chamava. Os olhos claros e sérios, o pássaro estranho e a voz angelical irrompiam o cenário urbano. Ao seu redor pessoas aleatórias se amontoavam para admirar o talento daquela criança. Sem instrumento algum, a menina passava os dias a cantar, a impressionar com sua voz de anjo. Sua imagem circulava o mundo virtual. Sua voz se propagava de celular em celular que a gravava. Mas ninguém perguntava seu nome. Ninguém se importava com sua história. Os que, por uma centelha de segundo, se importavam, atiravam algumas moedas na bolsinha que aos seus pés permanecia. E no final do dia, quando o movimento urbano reduzia, as moedas eram reunidas pelo homem que se dizia seu pai – cujo trabalho era permanecer distante a observar a filha – e esta, com a voz de anjo engolida, seguia os passos dele. De volta ao subúrbio. Onde sua voz pouco importava. Onde tinha nome próprio. Onde sua história se fazia.