Archive for setembro 2014

Tabuleiro em construção


Evgeniy Monahov


A morte é algo realmente desconsertante. Não dá para viver só pensando nela. Tampouco dá para viver sem pensar nela. Se se vive pensando na morte, não se tem sossego na mente para desfrutar das felicidades que surgem na vida. Se se vive sem pensar na morte, não se dá o devido valor a essas felicidades. A morte é coisa que não se pode exagerar, nem menosprezar. Ela vem e vai, quando em vez, para te lembrar que nada é constante. Ela vem, desconserta algo aqui, retira uma peça do tabuleiro da vida, e deixa espaço para os vivos consertarem. Para que provem suas capacidades de reconstruir. E seguir construindo e reconstruindo, com a medida certa de consciência da morte, até que seja nossa vez de sermos retirados desse tabuleiro em construção.

Filtro de sonhos


The dreamcatcher - Emma Bazan

Desde o dia em que tatuou um filtro dos sonhos na pele de suas costas, nunca mais se envolveu em romances. A princípio, julgou ser preconceito dos homens com relação às mulheres tatuadas. Passado um tempo, pensou que estivesse em uma fase de solteirisse. Mas anos se arrastaram sem nenhum relacionamento se manter por mais de um dia e, então, começou a se questionar se seria aquela tatuagem que estava afastando-a de viver os pesadelos que eram os relacionamentos mal sucedidos de antes. Cansada da solidão, voltou ao tatuador e mandou desenhar uma paisagem qualquer por cima daquele filtro dos sonhos. Preferia viver a ilusão dos romances, e pagar sofrendo com os pesadelos dos finais, do que viver sozinha, à espera pelo sonho de um eterno amor verdadeiro.

Oração esperançosa


Aunt Dale in Contemplation - David Jon Kassan 

Subiu as escadas e se recolheu em um canto onde ninguém costumava ir. Entrelaçou os dedos das mãos, com força. Permaneceu de olhos abertos, para se certificar que ninguém se aproximava. Começou a sussurrar uma oração - ou ao menos era o que pensava ser aqueles versos que aprendera quando ainda nem sabia o que era a vida. Mas agora que sabia o que era a vida e sentia tão perto o perigo da morte, queria acreditar que aquela oração surtiria efeitos. Há muito que a tradição de fé havia se tornado minoritária. Os jovens eram crentes da ciência. Assim ela também o era... Até que recebeu a notícia de que a ciência não a salvaria. Então resolveu orar, porque as soluções dos mais novos, por mais racionais que fossem, não estava levando a lugar algum. Quem sabe a solução dos antigos resolvesse seu problema? Entre um mundo de fé e um mundo de ciência, ela ainda pertencia ao mundo dos esperançosos. Para ela, não importavam os meios. O importante era o fim: não deixar sua vida chegar ao fim.

Carta de desapropriação


La pasión II - Alberto Pancorbo

Tive que te deixar. Não suportava mais minha mente me importunando com mil questionamentos sobre ti. Questionamentos esses que não sei responder. Faz-te de enigma na minha vida e o que ganhas com isso? Ganhas um adeus! Cansei de viver perdidamente apaixonado por uma mulher que não compreendo inteiramente. E cheguei a essa conclusão, de que eu teria que te deixar, quando compreendi que a sensação de não te ter vem exatamente do fato de tu não ser do tipo de mulher que se tem. Ninguém pode te possuir! Tu não nasceste para ser propriedade. És proprietária em toda a tua essência! E isso me assusta... Como ficar com uma mulher que não compreendo por inteira? Que me surpreende? Que me possui? Minha mente não suporta esse amor todo! Por isso te deixo aqui. Ao menos levo comigo um amor que eu sinto e conheço bem: o meu amor por ti.

A escritora

Evilanne Brandão de Morais. Tecnologia do Blogger.