Archive for abril 2016

Lara, Aldo e o mundo


Gaston La Touché

Lara era tão frágil. Cheia de incertezas, indecisões. O mundo ainda era um grande enigma para seus parcos anos de vida. Era jovem e assumia que não sabia de quase nada. Por isso a timidez diante do mundo. Mas uma coisa sempre teve dentro de si: muita curiosidade.
Tal retrato psicológico de Lara logo encantou bastante Aldo, um homem já tão vivido. Ele se apaixonou pelas fraquezas dela. Sentiu ânsia de a proteger do mundo pelo resto da vida. Logo, empreendeu no desafio de a conquistar para si. E ela se deixou conquistar, mesmo com receio, mas motivada por pura curiosidade. Então, conquistada, passou a ser mulher superprotegida pelo homem. Aldo, antes cheio de boas intenções, passou a nutrir um grave sentimento possessivo. Queria limitar toda e qualquer forma de Lara se fortalecer, se descobrir. Queria substituir a noção de mundo na cabeça dela pela noção de viver completamente voltada para ele. Queria ser o único e exclusivo universo daquela mulher. Mas mal sabia ele que não se apaga o mundo diante dos olhos dos curiosos. E que curiosidade é o primeiro ingrediente para a porção de fortalecimento que toda pessoa precisa para superar seus próprios receios. E esse ingrediente, Lara tinha em boas doses. Logo, tudo era apenas uma questão de tempo. Mais dias, menos dias... Ela iria descobrir o mundo. Iria se descobrir.

O paciente


Hartley - Alice Neel


"Minha vida está uma merda. Sei que tudo é uma tempestade feita em copo d'água. Isso só piora ainda mais o sentimento que guardo sobre mim. Odeio minha fraqueza. Não tenho forças para procurar fazer aquilo que realmente gosto. E naquilo que faço, coloco pouco esforço. Das coisas boas que tenho, sou muito desmerecedor. Nada consegui por trabalho próprio. Em nada vejo meus esmeros. Sinto-me um completo nada. Algo que vive uma vida medíocre e espera o dia do fim".
Depois desse desabafo, o psicanalista olhou profundamente no rosto transtornado daquele homem. Viu nele mais um paciente. Paciente da vida, não só paciente de consulta médica. Paciente não de paciência, mas de estar passivo. Era mais uma pessoa inteiramente passiva diante da vida. E que não acredita no potencial ativo que tem. Mais um paciente do tempo. Das circunstâncias em que acabou se inserindo. Mais um no universo de pessoas pacientes. Que não mudavam o que era. Que viviam aquilo que não queriam. O seu trabalho era tentar motivar essas pessoas a deixarem de ser pacientes. E eis um longo trabalho, por isso deixou seus devaneios de lado. Pôs-se a trabalhar.


A escritora

Evilanne Brandão de Morais. Tecnologia do Blogger.